A contaminação

dos Não-Lugares.

Gozava eu, no anonimato de um alfa-pendular, da leitura de um livro que adquirira previamente para o efeito…

(Ciente da inequação da soma do seu valor com o bilhete versus as despesas de uma viagem de carro. E pensando: Que outro lugar poderá permitir um mergulho tão profundo nestas páginas? – Numa casa de férias; por certo o barulho das aves ou das árvores distrair-me-iam, ou então, o peso próprio do silêncio, ou a gula e a proximidade da cozinha.)

quando… a serenidade, que já durava hora e meia, foi interrompida, pela escuta da conversa duma senhora, que na janela do lado oposto da fila da frente, obrigava a outra a ler as notícias do seu jornal. (Ai, o meu horror às agendas mediáticas!) Assim, após comentar um estranho funeral, lá veio a notícia de abertura e o seu julgamento moral, não se inibiu de dizer, bem alto: “Era a morte!” e logo: “Andou a gozar connosco!” “Até foi para Fátima, fazer sei lá o quê?” (Será de fazer ressaltar o pormenor da senhora que se via mais directamente interpelada ter sobre as coxas uns apontamentos do Ministério da Justiça, provavelmente dirigidos a Oficiais de Justiça.) Obviamente, ninguém se opôs às suas razões, ou tentou mostrar outras visões, e havia mais passageiros visivelmente incomodados. Nem a senhora do Ministério da Justiça.

Como nos últimos tempos aprendi a não ter vergonha pelos outros, pois isso é puro preconceito, e cada um tem direito à sua opnião, em público, ou na televisão, pensei… em como poderia salvar meia carruagem deste espectáculo? Engendrei levantar-me e dizer-lhe: “Ela devia era ter matado os três filhos, para a estória ficar ainda melhor e a senhora mais revoltada!.” Só a ira se sobrepõe à ira. Não fiz nada. Cheguei e meti-me numa anónima viagem de metro. (Mesmo assim tive de fazer batota, porque reconheci uma cara, que não cumprimentei.)

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